"There was nothing to fear and nothing to doubt"
Falemos hoje desse polémico e malfadado género literário: a crítica musical.
Começo por referir que não é isso que eu tento fazer no blog. Aqui proponho-me, conforme escrevi no post de inauguração deste espaço, "contar uma história ou alguns factos relacionados" com música, essencialmente música que eu gosto.
As críticas das revistas e restantes publicações de música estão sempre sujeitas a um enorme grau de subjectividade. Mas o que me salta à vista é que todas estas publicações fazem as suas reviews com base num determinado bias (perdoem-me o anglicanismo, mas é o mais acertado vocábulo para este preconceito), seja ele do próprio escritor, seja ele para agradar ao público da própria revista (em linguagem técnica: o target).
Experimentem, por exemplo, pôr um hipster a falar de um álbum com espectro mainstream, qualquer que seja (desde U2 a Bon Jovi), e perceberão que ele o rejeita à partida.
Numa publicação direccionada a este público, como a Pitchfork, já se sabe que os leitores não querem ler que um álbum comercial (um álbum que potencialmente venda mais que, digamos, 1 milhão de cópias) é excelente. Porque se é comercial, é sinal que muita gente gosta e os hipsters ouvem música tendo em conta a sua exclusividade.
É imbecil, eu sei, mas é assim que funciona.
Pensem quantas vezes ouviram o vosso amigo hipster tecer loas a uma determinada banda para, meses mais tarde, se essa banda entretanto se tornar popular, a desfazerem com a mesma vontade. Neste sentido, uma crítica da Pitchfork a um álbum comercial funciona apenas como um cardápio de motivos para "desmanchar" esse álbum.
Experimentem agora pôr um escritor desta publicação, a fazer uma crítica a um álbum dos Oasis. Já se sabe que vem lá borrasca. Os Oasis são o típico exemplo de uma banda indie rock que é recorrentemente visada pelos hipsters, por se terem tornado tão populares e por gostarem e se alimentarem dessa popularidade. Nada do que façam poderá algum dia ser valorizado.
No pólo oposto está uma banda da mesma época que os Oasis, mas que trabalha num registo bastante diferente: os Radiohead.
Se colocarem o mesmo escritor da Pitchfork a fazer uma crítica dos Radiohead, é possível que por menos inspirado que seja o álbum, ele ainda assim consiga ali ver ouro de 24 quilates. É o bias que falei há pouco.
Pegue-se no exemplo do último álbum "The King Of Limbs". Eu achei o álbum penoso. Achei que a musicalidade foi comprometida em virtude do experimentalismo "for the sake of it". Tem alguns bons momentos, mas é globalmente penoso.
Para pintar correctamente a minha opinião relativamente a este álbum, faço minhas as palavras de uma amiga:
"Eu ouvi o KOL uma vez e disse mesmo: "Epá não. Não fiz mal a ninguém para ter de ouvir isto novamente""
...e, no entanto, foi um álbum aclamado quase transversalmente pela crítica. Enfim, talvez seja eu e seja ela, que não estejamos a ver bem as coisas.
Mas depois recordo-me de um episódio que assisti no dia em que o álbum foi lançado. No Facebook, um amigo meu escreveu o seguinte:
"Os Radiohead têm um novo álbum e ainda não ouvi, mas nem preciso, porque já sei que vai ser brilhante!"
"Ainda não ouvi e já sei que vai ser brilhante"?! A sério? Digam lá se isto não é uma forma diferente de contar a história da "Roupa Nova do Rei".
Conforme podem comprovar pelo fui escrevendo ao longo dos anos, eu sou o maior fã que podem conhecer dos Queen e nunca ouviriam uma coisa destas da minha parte.
O sentido crítico relativamente aos Radiohead, para algumas pessoas, críticos profissionais incluídos, desvaneceu.
Eu gosto muito dos Radiohead, não fiquem com a ideia errada. Eles são, de facto, brilhantes. Ao longo da sua carreira, conseguiram constantemente experimentar coisas novas, raramente perdendo a musicalidade.
Porém, os Radiohead têm algo que me "impede" de gostar ainda mais deles: os fãs.
Eu acho óptimo que a banda divague nas direcções que bem entender, mas não é por isso que tudo o que eles façam tenha que ser fantástico. Tenhamos calma e espírito crítico.
Um bom exemplo do experimentalismo virtuoso dos Radiohead, sem perder a musicalidade, foi a dupla pedrada no charco em 2000/2001 com os álbuns "Kid A" e "Amnesiac". Especialmente "Amnesiac", onde foram parar os temas mais melódicos das sessões de 1999/2000, como é o caso de "Pyramid Song" - um dos meus temas preferidos da banda.
Fazer crítica musical e espetar estes carimbos à música é algo que eu poderia fazer aqui no blog, mas prefiro evitá-lo. Dou a minha opinião, sim; mas prefiro falar de música que gosto, ou de artistas que gosto, mesmo que de alguns trabalhos menos bem conseguidos.
Prefiro destacar o lado positivo, porque é isso que gosto de retirar da música.
Acho que, para se fazer uma "crítica" fidedigna e imparcial, é preciso poder apreciar o artista. É preciso, no mínimo, ter a mente aberta para tal; não ter um preconceito à partida sobre ele.
É por isto que desprezo da mesma forma os fãs-cegos que idolatram tudo o que os seus artistas fétiche fazem, como aqueles que rejeitam à partida a música de alguém que é popular, porque esse alguém é popular. Ambos são ridículos na mesma medida.