"No tears to cry, no feelings left. This species has amused itself to death."
Depois de falar nos Pink Floyd de David Gilmour (na prática, é isto) e de Richard Wright, chega a vez de Roger Waters.
Eu sei, nos últimos tempos tenho batido muito no tio Roger aqui no blog e ainda não dei a devida atenção à sua obra a solo. Mas isso não quer dizer que não goste dele.
Falar em Roger Waters é falar num dos maiores génios da história do Rock, criador dos álbuns conceptuais mais superlativos algumas vez gravados. É da cabeça deste génio criativo que saíram as ideias (não necessariamente toda a música) que resultariam em "The Dark Side Of The Moon", "Animals" e "The Wall". Não é de somenos.
Roger Waters é, de facto, um génio criativo. O problema de Roger é que o título de génio criativo lhe foi atribuído... por ele próprio. Reza a História que esta auto-indulgência pode ser extrapolada toda a sua personalidade.
Para ser friamente honesto, Roger era - pelo menos até há bem pouco tempo - o tipo de pessoa com quem nenhum de nós gostaria de se cruzar.
Se há um adjectivo que vemos repetidamente atribuído a Roger, esse será o de Prick (tradução livre: anormal/idiota/cabrão). "Roger is a prick", disse um dia David Gilmour, para explicar porque é que não falava com ele há 15 anos. "Just another prick in the wall" (esta tem piada), chamou-lhe recentemente este colunista, devido às suas posições anti-Israel.
Eu sou mais simpático e chamar-lhe-ia o maior egomaníaco da história do Rock, com tanto de mérito, como de idiota. Não poderá ter sido fácil trabalhar com ele, especialmente na sua fase mais obnóxia, durante a 2ª metade da década de 70 e 1ª da década de 80.
Foram precisos muitos anos para amansar a fera. Só recentemente parece ter enterrado o machado de guerra com David, tendo até marcado presença num evento de caridade promovido por Gilmour, favor que este retribuiu ao aparecer num concerto de Roger, para uma lendária rendição de "Comfortably Numb".
Mas o facto de eu o criticar e de até me pôr ao lado dos seus companheiros dos Pink Floyd devido à sua personalidade detestável, nada disso significa que eu não me identifique com o que escreveu Roger. Porra, se há alguém que conseguiu pôr em disco os meus medos, os meus dilemas e as minhas lutas internas, esse alguém é Roger Waters (e Bruce Springsteen, obviamente).
E ainda assim, nunca dediquei grande atenção à obra a solo de Roger Waters aqui no blog. Poderia ser obra do acaso, mas não é. O problema é que a obra a solo de Roger não é assim tão boa quanto isso.
Em meados dos anos 80, Waters estava deserto por se ver livre dos restantes membros dos Pink Floyd, por achar que eles já não contribuíam nada para as suas criações. Saiu assim dos Pink Floyd em 1984, alegando que estes eram já uma "força esgotada" (estou a citar) e ingenuamente presumiu que a banda tinha terminado, por não fazer sentido sem a sua presença. A vaidade sair-lhe-ia cara, uma vez que o futuro provaria que não poderia estar mais enganado e os Pink Floyd lançariam mais
Se houve alguém que sofreu com a separação dos Pink Floyd, esse alguém foi Roger Waters. Sem David Gilmour, sem Richard Wright, músicos que ele considerou dispensáveis e esgotados, as ideias de Roger nunca mais puderam ser materializadas em música que o público quisesse ouvir.
Roger foi buscar Eric Clapton, Jeff Beck e Andy Fairweather Low para fazer de David Gilmour, mas nenhum deles tapou os buracos que ele próprio abrira com o seu ego. Uma pena. E por que não, uma lição para a vida de todos nós.
Nesta matéria eu falo à vontade, uma vez que a discografia de Roger Waters foi a primeira que eu conheci a fundo, de todos os membros dos Pink Floyd a solo.
No meu top de álbuns a solo dos Pink Floyd (vá lá, não façam essa cara, é óbvio que eu tenho isto categorizado e ordenado), em primeiro vêm "On An Island" de David e "Wet Dream" de Rick, quase ex aequo e só depois surge "Amused To Death" de Roger.
"Amused To Death" é o 3º álbum a solo de Roger Waters (o 4º, se contarmos com a colaboração com Ron Geesin em 1970) e o último a ser lançado até hoje; já remonta a 1992, já lá vão 22 anos.
Esqueçam as melodias. Em "Amused To Death", elas são inexistentes, ou estão tão difusas na quantidade torrencial de efeitos sonoros (explosões, comentadores, telefones, entrevistas, etc etc), que são praticamente imperceptíveis. Valham-nos um Jeff Beck e um Patrick Leonard em grande forma, que nos vão dando alguns laivos de musicalidade aqui e ali.
Na maior parte do tempo, o tio Roger tem coisas para dizer e quer que vocês ouçam. Estamos no início dos anos 90 e a televisão assume um papel mais importante que nunca na sociedade.
A Guerra do Golfo é transmitida em directo para grandes audiências, Roger Waters não concorda e, como não poderia deixar de ser, quer falar sobre isto. Mais uma vez, muita política.
"Amused To Death" marca o culminar de um ciclo que começou em "The Wall", continuou em "The Final Cut" e prolongou-se pela discografia a solo de Waters ("The Pros And Cons Of Hitchicking" e "Radio K.A.O.S."), ciclo esse que eu chamo de purificação de Waters (grande trocadilho). À medida que Roger foi ganhando poder, a sua música foi ficando cada vez mais insípida, com cada vez mais foco nas palavras e menos (ou nenhum) na melodia.
Faltam as melodias, mas isso não significa que este álbum não seja capaz de nos tocar. E mais: que este não seja um grande álbum; que é. Mas poderia ser muito melhor e esse é que é o problema.
Nunca ouvi este álbum dele mas aqui há uns tempos estava a pesquisar uns livros e descobri este: http://www.amazon.com/Amusing-Ourselves-Death-Discourse-Business/dp/014303653X.
ResponderEliminarO autor disse numa entrevista: "In fact, readers should know that Roger Waters, once the lead singer of Pink Floyd, was sufficiently inspired by a book of mine to produce a CD called Amused to Death. This fact so elevated my prestige among undergraduates that I am hardly in a position to repudiate him or his kind of music. Nor do I have the inclination for any other reason. Nonetheless, the level of sensibility required to appreciate the music of Roger Waters is both different and lower than what is required to appreciate, let us say, a Chopin étude. (http://www.ingsoc.com/waters/albums/amused/response.html) :)
Ha! Sempre a aprender! Não conhecia a ligação com esse livro, mas parece óbvio que desde a temática do livro até ao título, o tio Roger foi ali beber a sua inspiração.
EliminarDepois, é interessante ver a condescendência do autor perante a música rock em geral e a música do Roger Waters em particular. Ao mesmo tempo que admite que o seu trabalho ganhou maior notoriedade graças à música do Roger, despreza essa facção dos seus leitores, resumindo-os aos undergraduates. Snobs da música clássica... Conheço alguns ;)
"Snobs da música clássica", true! :D
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