terça-feira, 14 de agosto de 2012

George Harrison - "All Things Must Pass"

"All things must pass, none of life's strings can last
So I must be on my way and face another day"



Adoro o George Harrison.
Ele pode até ter sido o "Quiet Beatle" - o mais modesto e discreto elemento dos The Beatles. Contudo, ele carrega uma aura que nenhum dos outros alguma vez atingiu. Talvez devido à sua devoção espiritual, ou às influências indianas, há algo em George de único, que lança a sua música para um patamar de apreciação metafísico. Isso é particularmente audível no seu tour de force "All Things Must Pass" - o primeiro álbum a solo de George, lançado em 1970.
"All Things Must Pass" é um álbum fabuloso, mas é mais que isso. É divinal.


"All Things Must Pass" é um álbum duplo, que resulta de uma gigantesca pilha de temas que George Harrison tinha deixado de lado ao longo do seu tempo nos Beatles, onde estava limitado a uma pequena quota de temas por álbum. Dos poucos que George conseguia meter nos álbuns dos Beatles, apenas "Something" chegou a single e só em 1969, ano de despedida da banda.
Temos que ter em conta que os Beatles eram fundamentalmente a banda de Lennon e McCartney... onde Harrison também tocava. Os seus momentos de protagonismo na banda foram muito efémeros e concentrados na fase final, onde a escrita de Harrison melhorou exponencialmente, com temas como "Something", "Here Comes The Sun", ou "While My Guitar Gently Weeps".
Este domínio de Lennon e de McCartney (principalmente de McCartney que, não por acaso, era chamado de "Bossy Beatle") sobre Harrison ficou bem demonstrado no filme "Let It Be" e na discussão com Paul, durante os ensaios para "Maxwell Silver Hammer". Farto de ser subjugado pelos seus colegas, George saiu furioso do estúdio e foi para casa escrever "Wah-Wah", tema que mais tarde seria também incluído em "All Things Must Pass".

Eu disse que "All Things Must Pass" era um álbum duplo? Esqueçam. É sim um álbum triplo, se contarmos com o disco bónus "Apple Jams", incluído na caixa de LP's original:


A quantidade de material que George Harrison tinha guardada para o seu primeiro álbum a solo era tão grande que deixou o produtor do Phil Spector completamente estarrecido, como o próprio conta no (excelente) filme biográfico de George "Living In The Material World" de Martin Scorsese (que recomendo vivamente). George chamou Spector para lhe apresentar o seu material e à medida que sacava de mais e mais temas que tinha empilhados dos tempos dos Beatles, Spector apercebia-se que George tinha em mãos um filão colossal e que a grande dificuldade seria fazer uma triagem daquilo tudo para o seu primeiro álbum a solo. O resultado da triagem acabou por ser um álbum duplo (mais o "Apple Jams"), dos melhores álbuns duplos de sempre, um álbum que rivaliza com o melhor que os The Beatles já fizeram. Uma maravilha musical, um álbum divinal.


Eu não sei se têm a noção do que vos espera em "All Things Must Pass". É um álbum que pode mudar a vossa vida. A minha, mudou um bocadinho com certeza.
Diria que este foi um dos álbuns que teve mais impacto na minha vida, mas um impacto diferente do que teve, por exemplo, "Appetite For Destruction" dos Guns N' Roses na minha adolescência. "All Things Must Pass" é uma mensagem de esperança, uma lufada de ar fresco, uma aterragem suave num colchão de água, forrado com lençóis de seda.



Sempre que ouço este álbum, sinto um arrepio na espinha. É uma sensação estranha... Como que se fosse esmagado, subjugado, overwhelmed pela beleza da música.
Não há vez nenhuma que eu ouça a entrada explosiva de "Awaiting On You All" ou "Let It Down", o riff de "Art Of Dying" (tema que conta com um Phil Collins de 17 aninhos na percussão), ou a introdução de bateria de "Hear Me Lord", que eu não sinta o tal arrepio na espinha.
Não sei se é o do uso contínuo da slide guitar (instrumento que eu adoro), se do preenchimento da paisagem sonora pela densidade de instrumentos resultante da produção "Wall Of Sound" de Phil Spector... Não sei, mas este álbum mexe comigo. Mexe comigo de uma maneira que mais nenhum álbum a solo dos The Beatles faz; mais: que nenhum álbum dos The Beatles faz; mais ainda: como muito poucos álbuns fazem.
Eu sei que tenho um uso fácil dos superlativos (como me diz uma amiga frequentemente: "Nuno, nem tudo pode ser o melhor de sempre!"), mas confiem em mim relativamente a "All Things Must Pass". É um álbum que vos vai atirar para um lugar de paz e tranquilidade.

"Now the darkness only stays the night-time, in the morning it will fade away..."

Pessoalmente, foi o meu álbum de 2011, o álbum que mais me marcou no ano que passou. É um álbum que associo a bons tempos que passei em Londres e todos sabemos como nos sentimos relativamente à música ligada a bons momentos.

Adoro o George Harrison. Já o tinha dito?
Ele pode ter sido o "quiet Beatle", uma figura de segundo plano da banda. Mas na minha opinião, foi ele quem escreveu o melhor tema da banda ("While My Guitar Gently Weeps"), lançou o melhor álbum a solo ("All Things Must Pass") e... last but definitely not least, tinha a mulher mais bonita entre todos os The Beatles: a maravilhosa Pattie Boyd.



Pattie Boyd, que faria com George Harrison e Eric Clapton o triângulo amoroso mais lendário da História do Rock, uma disputa entre dois melhores amigos pela mesma miúda, que resultou nalgumas das baladas mais fantásticas de sempre. Mas isso é assunto para outras núpcias...

9 comentários:

  1. É bastante engraçado isso que a tua amiga te disse porque é (também) por isso que gosto tanto do teu blog. É que para além de escreveres bem, saberes expressar-te e teres conhecimento sobre o que falas, transparece toda a intensidade com que sentes a Música e o que representa para ti. Eu leio-te e no fim dos posts tenho aquela urgência de ir conhecer bandas que desconheço ou ouvir com mais atenção as que já conheço. Eu leio artigos ou blogs que me dão a conhecer muita coisa mas encontrei aqui um tipo diferente de adoração da Música :)

    Isso tudo para te dizer que sou ignorante no que toca à carreira a solo do George Harrison mas no fim do post é aquele sentimento: "porra, TENHO de ir ouvir" :P ainda por cima ainda não vi esse filme do Scorsese...

    E por falar em Londres, não sei se viste a cerimónia de encerramento dos Jogos Olímpicos mas parecia feita para ti lol: David Bowie (mesmo sem ele lá ter estado), George Michael, Pink Floyd (desconheço o rapaz que foi cantar mas parece que houve muita gente a pensar que a "Wish You Were Here" era um single novo dele :x http://www.gigwise.com/news/75410/ed-sheeran-fans-mistake-pink-floyd-hit-for-new-song) e Queen (se ignorares a cantora que foi "fazer" de Freddie...) :P

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    1. ops, "Queen" queria eu dizer ;P

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    2. :)
      Com tanto elogio deixas-me mais uma vez desarmado... mas extremamente contente! Mesmo! :) Porque a ideia do blog é exactamente essa, despertar o interesse de quem lê pela música que eu gosto, dando a conhecer o meu ponto de vista sobre ela. Quer dizer, a ideia inicial era fazer um post por dia (daí o nome do blog, que de tão dull (hoje teria uma ideia muito melhor ;-) ) que é, já me arrependi imenso) mas cedo percebi que tal era impossível, porque a forma que eu escrevo não mo permite. Como já percebeste, a maioria dos posts reflecte a forma intensa como eu vivo a música (e a vida no geral, vá... :P ) e eu só consigo materializar isso em palavras em dias de inspiração. De inspiração e de tempo livre, que escasseia também... Até porque a minha actividade profissional é bem mais empírica, não tem nada a ver com isto...

      Eu podia ter aqui algo do género mais "informativo" (com a actualidade das minha bandas preferidas), ou mais de "crítica", com classificações e tal, e talvez assim tivesse mais tráfego e de certeza com muito menos esforço. Mas não é isso que eu quero.

      Mas quando me dizes que eu consigo transmitir um bocadinho dessa intensidade, na medida em que te "puxo" para descobrires música, é o maior elogio que me podem dar! Por isso também te digo, a tua aparição aqui foi a melhor coisa que já aconteceu ao meu blog. Durante muito tempo, ficava com a sensação que escrevia só para mim e às vezes pensava se valia a pena continuar a publicar algo que ninguém lia. Não que eu não tivesse algumas page-views, mas sem feedback, não havia maneira de saber se isto servia para alguma coisa ou não. Se já atingi uma pessoa, uma que seja, então já valeu a pena. :)

      O "All Things Must Pass" do George Harrison é um tesouro escondido. É um álbum bastante obscuro (comparativamente com outros álbuns a solo dos Beatles), mas para mim é o melhor deles todos. E com excepção do "Band On The Run", que também é fantástico, é o melhor e de longe.
      O filme do Scorsese vale mesmo MUITO a pena, é uma introdução perfeita à vida e obra do George e (felizmente) foca muito tempo no "All Things Must Pass", que é o ponto mais alto da sua carreira. O George era uma pessoa muito particular e no filme, ele não é tratado como nenhum herói, é descrito com virtudes e defeitos, tal como era, pelas pessoas que o conheciam mais de perto. E com a realização do Scorsese, como deves imaginar, só pode ser um grande filme. Grande em todos os sentidos, porque se bem me lembro tem mais de 4 horas! Vi-o o ano passado no DocLisboa e no fim deu-se uma ovação de pé na sala de cinema! Nunca tinha assistido a nada assim, foi lindo. :)

      Já sei que a cerimónia de encerramento dos JO foi fantástica, recebi uma série de mensagens a dizer o mesmo que tu :P mas infelizmente não pude ver. Neste momento estou de férias (para os teus lados :) ), mas praticamente isolado de tudo, sem TV e com uma ligação à net por uma pen fantástica que apanha rede durante 1 minuto a cada 10 e com um PC antigo (o meu habitual está no arranjo) que sobreaquece e desliga a cada 5/10 minutos... Enfim, um cenário dantesco! lol
      O meu plano era aproveitar as férias para desenrolar uma série de ideias para posts aqui no blog e escrever, escrever, escrever... Mas não estou com grande sorte com os computadores. :(

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    3. Na minha humilde opinião, é precisamente este formato que torna o que tens aqui especial e único porque blogs e artigos de opinião com classificações ou do tipo jornalístico há muitos, eu leio mas não sinto vontade de comentar na grande maioria das vezes… Sem falar que às vezes acontece gostar muito do texto em si mas falta-me sentir identificada com o escritor, dá a ideia que escrevem na terceira pessoa… (não literalmente mas é a impressão que dá) e distanciam-se do que escrevem, não os sinto ali e isso não me permite identificar com quem escreve.
      Já tinha reparado nesse pormenor do título do blog e pensei que provavelmente seria esse o teu objectivo inicialmente mas realmente seria impossível conseguires todos os dias ter tempo e inspiração :/ Eu gosto de escrever mas às vezes passam-se semanas e meses em que não sai nada…

      A tua aparição aqui foi a melhor coisa que já aconteceu ao meu blog. Agora sou eu que fico encavacada! É que nunca fui a melhor coisa que aconteceu ao blog de ninguém ;PP obrigada ;)
      Ainda bem que nunca deixaste de escrever aqui, mesmo quando achavas que poderias estar a fazê-lo só para ti. E já vi mais gente para além de mim a elogiar os teus posts, quando escreveste sobre o concerto do Bruce ou sobre Pink Floyd por exemplo ;)

      Já me puseste a ouvir música, a ver alguns filmes, até a ler livros lol :P (já há algum tempo que queria ler o “Animal Farm” e depois do post dos Pink Floyd pensei: “olha, é desta”.) Se há coisa que eu gosto verdadeiramente é que me dêem coisas para ver, para descobrir, coisas sobre que pensar… :) Como podes ver, atingiste (pelo menos) uma pessoa sim.
      Acho que na primeira ou segunda vez que comentei um post teu, te disse que iria voltar sempre que tivesse algo a dizer. Provavelmente na altura não tinhas noção que estava a falar muito a sério :PP

      Já arranjei o filme entretanto. Acredito que seja mesmo bom, tendo em conta o que dizes e sendo do Scorsese :)

      É pena não teres visto a cerimónia mas quando voltares de férias e o teu PC estiver bom, de certeza que "arranjas" isso facilmente ou mesmo no You Tube (se não tirarem entretanto) :)
      Realmente não tens tido sorte nenhuma com os computadores :x que odisseia… Também tive um portátil que sobreaquecia e se desligava com muita frequência. Quantas vezes não me apeteceu mandá-lo contra a parede lol ahhh!! fuck this shit! :P

      (já agora, continuação de boas férias nesta margem do Tejo ;) )

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    4. É curioso que fales na distância do escritor à sua escrita, porque essa é uma questão que me ocorre (muito) frequentemente. Isto é, embora eu escreva num registo sempre bastante pessoal, muitas vezes sou subconscientemente obrigado a rejeitar, ou apagar algumas coisas que escrevo, para não correr o risco de tornar isto uma espécie de diário, ou expor demasiado o que sinto. Acredita, sou uma verdadeira centrifugadora a rejeitar parágrafos mais "pessoais". Já cheguei ao limite de rejeitar posts inteiros, que ficaram pelo rascunho e nunca foram publicados! Mesmo assim, o resultado visível é este! :)

      Inspiração e tempo são coisas que até tenho tido nos últimos dias, de tal forma que na praia, só com a esferográfica e o caderno, já escrevi uma série de posts, que apenas aguardam edição e "batimento" no teclado, assim que tenha condições para tal!

      Mantenho o meu agradecimento à tua aparição aqui, tal e qual o escrevi :) Só o facto de saber que a minha escrita afectou alguém, a motivação para continuar aumenta exponencialmente! Por isso espera continuação ao blog ;-)

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    5. Sim, percebo o que dizes. Nota-se perfeitamente que dás o teu cunho muito pessoal mas ao mesmo tempo não te expões em demasia :) na minha opinião, acho que é na medida certa (pelo menos é a minha percepção quando leio).

      Já vi o documentário e gostei bastante. Para além de estar muito bem feito (o Marty é assim :P), havia várias coisas na personalidade do George Harrison que para mim fazem todo o sentido e que reflectem a minha própria forma de estar na vida. Há coisas que ele diz ali que ressoam. Não digo tudo, mas aquela parte que procura sempre um sentido nas coisas, uma consciência profunda do mundo e de tudo à nossa volta... Há algumas músicas dos Tool (a "Lateralus", a "Reflection" ou a "Parabola" por exemplo) que me fazem lembrar imenso certas coisas que são abordadas no filme :)

      O álbum em si, ouve-se mesmo muito bem! Em dias de Verão como estes então, nem se fala :)

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    6. O documentário do Scorsese é fenomenal, não é? Quando eu o vi no cinema (e depois da salva de palmas com que acabou o filme), a sensação com que saí da sala é que ele era um grande homem. Um homem cheio de defeitos e virtudes (ambas cruamente abordadas no filme), como todos somos, mas fiel aos seus princípios e à sua arte. Principalmente no que toca à espiritualidade, ele levava as coisas a um nível que, para mim, era demasiado "para lá". Mas como tu dizes, a forma como ele viveu fiel às suas crenças é algo que ressoa. A mim ressoou certamente. Não fazia as coisas como ele fez, mas ele tinha a sua mania e seguiu-a cegamente. Saí dali a admirar o homem!

      O "All Things Must Pass" foi para mim daquelas descobertas maravilhosas que eu tinha que partilhar! Eu tenho o álbum no telemóvel e todos os dias há pelo menos um tema na minha cabeça, isto desde há 9/10 meses. É assim tanto que eu gosto disto. :)

      Tenho que dar mais tempo de antena aos Tool, gostei imenso do "Lateralus", mas este Verão virou numa direcção musical mais "light" para mim. Mas vou continuar a ouvir com certeza!

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    7. Agora tenho pena de não ter visto no cinema. Por acaso ainda só fui ao DocLisboa uma vez, em 2009 ou 2010...

      Sim, ele parecia uma pessoa mesmo genuína e que encontrou um sentido para a vida dele e foi atrás. Gostei muito da filosofia de vida dele mas não necessariamente de tudo à volta dela. Passei a respeitá-lo imenso! Pormenor: não sabia que ele tinha financiado o "Life of Brian" dos Monty Python :)

      Os Tool são aquele tipo de banda que consume uma pessoa, se esta começar a entrar a sério naquele mundo :P por isso se calhar até é melhor não te dedicares já a eles lol

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    8. Os Tool terão o seu tempo! Eu sou de "fases" e para já, chamaram-me a atenção, o que significa que mais dia menos dia eu vou "mergulhar" na obra deles e depois... depois logo se vê :P

      O projecto dos Monthy Python foi um daqueles que arrasou a carteira do George, mas a filosofia que ele tinha em relação ao dinheiro era a de gastá-lo naquilo em que ele gostava / acreditava. De nada serve se estiver a fazer algarismos no extracto de conta! Mais ou menos a mesma filosofia que eu tenho :P

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Let the music do the talking.