terça-feira, 8 de janeiro de 2013

David Bowie - "Where Are We Now?"

"You never knew that... That I could do that"


Bowie voltou.
Já poucos esperavam o seu regresso. Mas no dia em que fez 66 anos, David resolveu quebrar o lago gelado em que se encontrava a sua carreira e lançar o primeiro calhau.
Um tema novo - "Where Are We Now?" - já está aqui para todos ouvirmos. Um álbum novo - "The Next Day" - chegará no dia 11 de Março e é o seu primeiro em 10 anos (o último tinha sido "Reality", de 2003).
David Bowie esteve de fora muito tempo, demasiado tempo. No anúncio oficial, o seu site deu conta desta prolongada ausência:
"In recent years radio silence has been broken only by endless speculation, rumour and wishful thinking... a new record...who would have ever thought it, who'd have ever dreamed it! After all David is the kind of artist who writes and performs what he wants when he wants...when he has something to say as opposed to something to sell.
Today he definitely has something to say."

Então, afinal, o que é que Bowie tem para dizer?
Na minha opinião, "Where Are We Now?" é um bom tema... que não compromete. Não é extraordinário, mas também não corre grandes riscos.

O tema evoca a era de Berlim de Bowie (isto é, o período que compreende os álbuns "Low", ""Heroes"" e "Lodger"), uma época de grande revolução na sua música, cujo impacto na música de outros artistas (nomeadamente no seu país) é hoje já bastante reconhecido. Mas a verdade é que "Where Are We Now?" se assemelha mais ao período neo-clássico Bowie, dos anos 00, do que ao período de Berlim (para o qual eu tenho programado um post, a sair muito brevemente), do final dos anos 70. 



A aproximação ao período (hoje) mais cool da carreira de Bowie é perceptível (até a capa da edição de luxo do álbum é um makeover da capa de ""Heroes""), mas não é materializada nesta primeira amostra de "The Next Day".
Note-se que colocar "The Next Day" ao lado de um álbum como "Heathen" (de 2002), em vez de ""Heroes"" (de 1977), em nada o desqualifica; é apenas uma comparação mais realista, para um artista que já leva uma carreira a entrar na 5ª (!!) década.

Julgando pela sua primeira amostra, não me parece que "The Next Day" seja o álbum do grande comeback de David Bowie. Parece-me, sim, o álbum do seu "adeus".
Bowie não procura aqui uma revolução na sua sonoridade, como fez tantas vezes ao longo da sua carreira; como fez quando foi para Berlim em 1976. Nessa altura, Bowie impregnou na sua música as influências vigentes na cidade - a Electronica e o Krautrock - e obteve os resultados brilhantes que hoje conhecemos.
Hoje, as influências vigentes em Berlim continuam dentro da Electronica, mas agora em estilos mais focados como o Dubstep ou o House. Aos 66 anos, duvido que David Bowie tenha grande interesse em enveredar por esse caminho. E eu duvido que isso fosse, sequer, boa ideia...

Mais... mais, para já, não sabemos. Da minha parte, já estou a fazer figas com dedos das mãos e dos pés, para que David Bowie volte à estrada em 2013 e eu possa finalmente ver o Thin White Duke ao vivo. Nem que, para tal, tenha que voltar a Londres.

Para já, o que fica é que "Where Are We Now?" é bom e é Bowie... e isso é óptimo.
Para já, isso basta para nos encher o coração. 
Para já, o importante é que... Bowie voltou.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

George Harrison - "Hear Me Lord"

"Now, won't you please... Please... Hear me, Lord"



Hoje volto a "All Things Must Pass" para fechar 2012 e vos falar na categoria que falta: o Tema do Ano. A minha escolha é o divinal "Hear Me Lord".
Em Agosto, já aqui falei da grande obra-prima de George Harrison; o albatroz da sua discografia; o álbum onde o Quiet Beatle almejou alcançar, sozinho, as alturas babilónicas dos The Beatles. Na minha modesta opinião, subiu alto, muito muito alto.
"All Things Must Pass" foi o meu álbum preferido de 2011 e foi, quase, quase, quase... o meu preferido de 2012. O volume de material que encontramos aqui é tão vasto, tão imenso, que a longevidade que este álbum teve comigo foi enorme.



"All Things Must Pass" é um álbum onde George Harrison abre o coração e despeja tudo o que lhe vai na alma. E como seria de esperar de George (principalmente nesta fase da sua vida), o que vai na sua alma é essencialmente fé.
A fé aqui exposta não está necessariamente ligada a uma religião específica, como deixa entender em "Awaiting On You All" ("By chanting the nameS of the Lord, you'll be free"); George nunca fala em Deus ("God"), mas refere-se repetidamente ao Senhor ("Lord"). O que George quer transmitir é que qualquer que seja a crença (e ele também tem a dele), o que é preciso é ter fé. Porque a fé é a luz que nos previne da escuridão ("Beware Of Darkness").

Ora bem, eu não me considero, de todo, uma pessoa religiosa. A invocação contínua do Senhor por parte de George, como figura religiosa da Salvação, não é uma acção com a qual eu me identifique directamente.
Mas tenho fé, pois claro. Tenho fé na verdade de valores (muitos deles cultivei com a aprendizagem religiosa que tive), fé na verdade de sentimentos, fé na verdade de pessoas que me rodeiam. Porque a fé é muito mais do que religião.

"Help me, Lord, please, to rise a little higher, hmmm-hmmm
Help me, Lord, please, to burn out this desire, hmmm-hmmm"

Por isso, a forma como George se entrega em "Hear Me Lord" deixou-me completamente rendido ao tema. George canta em desespero, despe o seu íntimo, revela as suas fraquezas, pede força para o ajudarem a ultrapassá-las e assim usa a fé como uma arma... para ser uma melhor pessoa. E se não é isso que todos queremos, é de certeza o que todos deveríamos querer.

"Hear Me Lord" é um dos temas mais pessoais que George Harrison escreveu em toda a sua carreira. George escava até ao ponto mais profundo do seu íntimo para sacar o que ouvimos. A sua inclusão no final do 2º disco de "All Things Must Pass" serve como uma chave de ouro, para fechar a sua obra-prima (não conto aqui com o 3º disco - Apple Jams).

Desde a explosiva introdução de bateria, que "Hear Me Lord" é um tema que me consegue, invariavelmente, arrancar arrepios na espinha. A beleza dos arranjos, da interpretação vocal de George e das harmonias, daquela slide guitar que se ouve a chorar lá ao fundo, do piano caótico a carpir as suas mágoas... é uma beleza que me esmaga. É tudo perfeito.

Em alternativa, ouvir George Harrison aqui, em modo solo, a cantar "Hear Me Lord" acompanhado apenas da sua guitarra eléctrica, despido de toda a produção de Phil Spector, pode ser ainda mais arrepiante. Decidam vocês.



Depois do post de Agosto e desta introdução, acho que já praticamente esgotei os elogios que poderia fazer a este álbum. O impacto que esta obra teve em mim está à vista e o que me resta agora é desafiar-vos a deixarem-se submergir nela, de mente livre e coração aberto, tal como eu o fiz, desde que o descobri no último terço de 2011.