sábado, 22 de janeiro de 2011

U2 - "The Fly"

"It's no secret that ambition bites the nails of sucess"



Depois do enorme sucesso do álbum “The Joshua Tree” e do pretensioso “Rattle & Hum”, os U2 chegaram ao fim da década de 80 com o estatuto de uma das bandas mais importantes na cena pop/rock internacional, com sucesso em ambos os lados do Atlântico.

Foi nesta altura que os U2 mostraram a sua ambição. Quando facilmente poderiam repetir o sucesso de "The Joshua Tree" com um álbum semelhante, decidiram "desmanchar" e voltar a construir, fazendo algo de completamente novo e embarcando numa tourné megalómana. E assim nasceu "Achtung Baby", um álbum arrojado, com uma sonoridade a romper intencionalmente com o passado, alienando milhares de fãs no processo... mas trazendo outros tantos.

O exemplo mais claro deste rompimento com as raízes está neste “The Fly”, o tema mais "heavy” até à data, propositadamente escolhido para single de avanço deste álbum. "The Fly" foi descrito por Bono como o "som de quatro homens a destruir "The Joshua Tree"".
Para mim, esta é a prova cabal de que quando os U2 querem fazer rock, sabem fazê-lo como poucos.


O resto é História. Os U2 criaram aquela que é, na minha opinião, a sua grande obra-prima: o álbum "Achtung Baby". Um álbum radicalmente diferente de tudo o que tinham feito antes, mas que conseguiu manter (aumentar?) a bitola de qualidade de "The Joshua Tree".
Mais do que isso, teve o condão de exponenciar as expectativas do público para tudo o que os U2 fizessem daí em diante. Uma banda com a capacidade de se reinventar, submetendo-se a uma transformação de som e imagem tão grande e mesmo assim elevando a qualidade da sua oferta... só pode ser uma banda muito especial.



A outra face da moeda foi mesmo a alienação de milhares de fãs, traídos por uma inesperada revolução na sua banda preferida. Se é verdade que, em contrapartida, foram angariados outros tantos milhares de ouvintes, mais importante que isso, os U2 ganharam o respeito do público e da indústria musical.

Questionado sobre a hipótese da mudança radical na música e na imagem dos U2 afastar alguns fãs, Bono não se mostrou preocupado e respondeu da seguinte forma lapidar:

"I'm into it, we're into it and the real U2 fans that have been around, they'll be into it.
We might lose some of the pop kids... but we don't need them"



Soberana a resposta por parte de Bono (pode ser vista no final do vídeo em cima). Como alguém já disse, os U2 passaram da banda mais quente dos anos 80, à banda mais fixe dos anos 90, pelo menos até sermos brindados com "Pop"...

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Oasis - "Gas Panic!" (Live At Wembley 2000 - "Familiar To Millions")

"What tongueless ghost of sin crept through my curtains?"



O álbum original com maior rotação na minha aparelhagem no ano 2000 foi "Standing On The Shoulder Of Giants" dos Oasis, de onde saiu este fabuloso "Gas Panic!".
Foi a minha fase mais Britrock / Britpop, numa época em que o género povoava a rádio, estando já a pouco tempo do seu "canto do cisne". Para além dos Oasis, havia os Blur, os Pulp, os Suede, os Coldplay (no começo), os Manic Street Preachers, os Travis... Enfim a "Grande Ilha" trazia muita música boa nesta altura.

"If you hear me tap on you window, you better get on your knees and pray. 
Panic is on the way!"
Na minha opinião, este é um dos temas mais subestimados dos Oasis. Se eles são correntemente acusados de fazerem música sem profundidade (e com alguma razão), este tema é um exemplo acabado do exacto oposto. "Gas Panic!" foi alegadamente escrito numa noite de delírio, enquanto Noel Gallagher se livrava do vicío das drogas. O tema retrata o pânico associado a essa experiência, mas na verdade pode ser relacionado com inúmeras outras situações.


O vídeo que fica aqui é de uma versão gravada no velhinho Estádio do Wembley, que está no álbum ao vivo "Familiar To Millions". Recordo-me vividamente da manhã fria de Sábado em que vi pela primeira vez este clip na TV. Era a abertura do programa "Top Rock" da TVI e este era apresentado como a próxima grande aposta da Rádio Comercial na altura. O tema entrou mesmo em powerplay (o nome que davam aos temas com maior rotação) nessa rádio durante algumas semanas, mas nunca ganhou grande notoriedade, uma vez que a banda não apostou na sua promoção (não foi lançado em single, apesar de terem produzido um vídeo). Para além disso, este está longe de ser um tema com potencial para se tornar um êxito para os Oasis, nem ao nível de "Go Let It Out" (do mesmo álbum) e muito menos ao nível de "Wonderwall".

Assim, não voltei a ver o clip durante anos, mas a imagem dos Oasis no lindíssimo Wembley (palco de outros concertos que eu cresci a ver) ficou-me na retina. Pessoalmente, tenho muita pena de não ter tido a oportunidade de ver um concerto ao vivo naquele estádio, entretanto demolido.
Já ouvi muitos álbuns ao vivo de muitos artistas e tendo em conta que há vários gravados no Wembley, posso dizer há algo que distingue esses álbuns ao vivo de todos os outros: a acústica.
A arquitectura do velhinho Estádio do Wembley proporcionava um eco que conferia uma acústica única, fabulosa para os concertos ao vivo. Esta acústica foi perdida com a construção do novo estádio e não há maneira de a recuperar...
Foi-se a estrutura, ficaram as gravações. Esta é uma das que vale a pena recordar.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Vangelis - "Light & Shadow"



O álbum de Vangelis "1492: The Conquest Of Paradise" teve um sucesso fora de tempo e inesperado. Aquando do seu lançamento em 1992, como banda sonora do filme com o mesmo nome (um filme muito interessante sobre a viagem de Colombo e que eu aconselho vivamente), o álbum passou despercebido e teve um sucesso muito parco, inserido numa curva claramente descendente na carreira de Vangelis.

Só em 1995/1996 e por razões de ordem diferente em vários países europeus (em Portugal, devido ao seu uso na campanha de António Guterres para as Legislativas), é que o tema-título "Conquest Of Paradise" teve uma enorme projecção e levou o álbum a um sucesso estrondoso, em boa hora rejuvenescendo a carreira de Vangelis e incentivando um público mais novo a descobrir os seus trabalhos mais antigos. Em boa hora, porque também eu me insiro neste grupo.

O tema que aqui fica é "Light & Shadow", uma das minhas peças preferidas deste álbum. Note-se que a letra dos cânticos que se ouvem neste tema não tem qualquer significado; são uma linguagem inventada (pseudo-Latim) usada para descrever as sensações que a música transmite, uma técnica denominada wordpainting. E sim, isto serve também para a célebre lírica do tema "Conquest Of Paradise", se é que alguma vez se questionaram o que é aquilo significava...



Se é verdade que a banda sonora compõe um álbum fabuloso, o filme não é menos interessante.
É um filme essencial sobre os Descobrimentos (embora não seja sobre a "nossa" parte), que eu recomendo quase sem reservas. Penso que não arrisco muito em dizer que este é mesmo o melhor filme jamais feito sobre a temática dos Descobrimentos. As reservas que tenho sobre o guião referem-se à forma invariavelmente pejorativa com que Portugal sai retratado...

Apesar disso, o filme conta com uma grande interpretação de Gérard Depardieu como Cristóvão Colombo, mostra cenários majestosos com bela filmagem e acompanha tudo com a sublime banda sonora de Vangelis. A banda sonora é amplamente carregada neste filme, projectando-o para uma dimensão superior. Repito: aconselho vivamente.

Nesta cena do filme, Cristóvão Colombo chega ao continente americano, oportunamente ao som de "Hispanola" de Vangelis:

domingo, 16 de janeiro de 2011

David Bowie - "Station To Station"

"The return of The Thin White Duke, throwing darts in lovers' eyes"



David Bowie vestiu a pele de diversas personagens ao longo da sua carreira. A mais conhecida de todas terá sido "Ziggy Stardust", um alien que trazia uma mensagem de esperança à humanidade, nos seus últimos 5 anos ("Five Years") de existência.

Em 1976, esses tempos já pareciam um passado longínquo. A carreira de David Bowie nos anos 70 foi de tal forma intensa (11 álbuns de originais em 10 anos, sem contar com álbuns ao vivo e compilações!!!), que nesta altura Bowie já tinha passado por estilos como o Psicadelismo, o Glam, ou o Soul.

E foi depois de uma passagem pelo Soul que, em 1976, David Bowie apresentou o sinistro Thin White Duke no tema "Station To Station", do álbum com o mesmo nome. Na verdade, este personagem já vinha sendo desenvolvido desde o ano de 1975, na promoção e digressão do álbum "Young Americans".


The Thin White Duke foi a mais pertubadora e macabra personagem de David Bowie: um homem aprumado e de fino recorte por fora, mas oco por dentro; um fascista; um homem que cantava canções de amor com uma intensidade agonizante, mas que nada sentia. "Gelo disfarçado de fogo".



"The return of The Thin White Duke, making sure white stays"

David Bowie vestiu a pele do Thin White Duke durante 2 anos (1975 e 1976), dentro e fora dos palcos, levando mesmo a que se tenha alienado da sua própria personalidade. Viciado em cocaína, Bowie vivia a fase mais negra da sua vida, expressando sentimentos racistas e ideologias fascistas nas entrevistas e comportando-se de maneira estranhamente altiva.

Bowie nunca escondeu que sofria de alguma esquizofrenia. Numa entrevista em 1973, ele confessa que tem o dom de ser um "coleccionador de personalidades":



O problema é que em 1976, o Thin White Duke parecia que se tinha apoderado de David Bowie, tornando a sua condição mental mais alarmante que nunca. Segundo o próprio, esta foi uma altura da sua vida em que vivia de "pimentos, cocaína e leite". Na introdução de "Word On A Wing" no VH1 Storytellers (gravado em 1999), David Bowie aborda o período em que personificou o Thin White Duke:

"1975, 1976, and a bit of 1974, and the first few weeks of 1977, were singularly the darkest days of my life. I found myself up to my neck in such negativity. And it was so steeped in awfulness that recall is nigh on impossible, certainly painful..."

O tema "Station To Station" serve assim de introdução ao infame personagem The Thin White Duke. É o tema de abertura do álbum com o mesmo nome e é a mais longa gravação de estúdio da carreira de David Bowie. Revelando um dos seus hábitos da época, este tema também contém uma das linhas (pun intended) mais célebres de David Bowie:

"It's not the side-effects of the cocaine, I'm thinking that it must be love"


Ao perceber que a sua esquizofrenia e o seu vício de cocaína estavam a corroer a sua saúde física e mental, David Bowie decidiu mudar de Los Angeles para Paris e depois para Berlim Ocidental. Berlim acabaria por ser a chave da sua carreira: em Berlim, Bowie livrou-se dos demónios do Thin White Duke e da cocaína e gravou com o produtor Brian Eno o core da inovadora Trilogia de Berlim ("Low", ""Heroes"" e "Lodger").