sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Arcade Fire - "Reflektor"

"It’s just a reflection of a reflection, of a reflection of a reflection."



E eis que após 3 meses de ausência (interrompidos apenas por Lou Reed), regresso hoje às lides do blog. Muito haveria para contar, mas o tempo é curto e a escrita preciosa.
Como tal, que melhor maneira de dar o pontapé de saída para o final de 2013 (que terá a inevitável revisão anual da matéria dada), que o álbum por que todos esperaram este ano? O álbum que foi feito em 2013 e que "fez" 2013? O álbum que epitomiza toda a cultura alternativa, exclusiva (cough... hipster), pseudo-intelectual, lustroso-por-fora/vazio-por-dentro dos anos 10's?
Falo, obviamente, de "Reflektor" - o 4º álbum de estúdio dos Arcade Fire.


Antes de mais, vou directamente à minha opinião sobre o álbum: "Reflektor" é um rochedo; um rochedo dançável. É um álbum duplo, com 13 temas e 75 minutos, fácil de degustar, mas difícil de digerir. É um álbum variado no estilo, rico nos ambientes, polido na produção.

Não era fácil suceder ao premiado "The Suburbs" (Grammy 2011), mas os Arcade Fire inspiraram-se nas memórias de acesso aleatório vindas de França e jogaram a sua sorte com um álbum que ambiciona conquistar as pistas de dança e manter a rodagem nos círculos alternativos.

Por outro lado, "Reflektor" é um álbum que vem carimbado com o selo da ironia, do sarcasmo, do cinismo e de todas as outras formas de retórica que devem masturbar a mente do mais orgulhoso hipster.

E é aqui que entramos na discussão que eu apimentei em cima. Já aqui falei dos hipsters e na acefalia da cultura da exclusividade. Note-se que os Arcade Fire não são impulsionares deste lustroso-por-fora/vazio-por-dentro característico desta década; mas no final de contas, são os hipsters o público-base da banda.
Era complicado aos Arcade Fire jogar com isto, mas eles fizeram-no e com mestria.

"Reflektor" é, acima de tudo, um álbum muito inteligente. Inteligente na forma e inteligente no conteúdo.
É inteligente no conteúdo porque é bom; aborda vários estilos (sem ser propriamente "inventivo") e arrisca, ainda que calculadamente, numa nova sonoridade.
É inteligente na forma, porque dispara em todas as direcções.
Com "Reflektor", os Arcade Fire querem fazer um disco maior que a banda, maior que a vida, maior que o Mundo; muito maior que o selo de Indie Rock hipster com o qual andam colados.
Mas por outro lado, os AF querem esse selo. Eles sabem que a sua base de fãs - sim, falo dos hipsters - querem ainda usufruir do prestígio da exclusividade, querem sentir-se especiais. Então os AF tentam ser irónicos, de modo a passar a mensagem: "Embora nos tenhas que partilhar com muitos outros, este álbum é para ti. Só tu é que nos entendes."

Diz a Pitchfork (publicação sempre simpática para com os AF) acerca de "Reflektor", enquanto invoca nomes de álbuns como "Low" (Bowie), "Exile on Main Street" (Stones), "The White Album" (Beatles), ou "Achtung Baby" (U2):
"The only way to make a Big Rock Record in 2013 is to make one that is skeptical of what it means to be a Big Rock Record in 2013."

Ah, pois, a ironia. 

"Reflektor", de irónico, tem muito pouco. Senão vejamos: "Reflektor" é um álbum Disco, num ano em que o Disco voltou; é um álbum grande (duplo), quando pretende ser um grande álbum; é um álbum que pretende lançar os AF aos grandes palcos e que lança os AF aos grandes palcos.
Os AF auto-proclamam-se irónicos, mas depois param em todos os apeadeiros do mainstream.
Eles vão "só" encabeçar o cartaz do Rock In Rio, ao lado de nomes como Justin Timberlake e Robbie Williams.

Ironia? BULLSHIT

O Noel Gallagher é que lhes tirou a pinta. (Leiam esta entrevista à Rolling Stone, onde Noel faz uma revisão de 2013, que é a melhor que eu já li nos últimos anos. A sério, pela vossa vida, leiam a entrevista!)

RS: Did you see that they've asked people to wear formal wear or costumes at their shows?[Arcade Fire has clarified that this dress code is "super not mandatory."]
Noel: [Sighs] Well, what's the point of that? Do you know what the point of that is? That is to take away from the shit disco that's coming out of the speakers. Because everybody's dressed as one of the Three Musketeers on acid. "What was the gig like?" "I don't know, everyone was dressed as a teddy bear in the Seventies." "Yeah, but what was the gig like?" "Ah, fuck knows, man, I have no idea. I was dressed as a flying saucer." "Yeah, but what was the gig like?" "Fuck knows. I don't know. Seen Cheech and Chong, there, though." Not for me.

A sério, que raio de ideia foi aquela de imporem um "dress code" nos concertos? Quem é que foi o idiota que se lembrou disto?
Não sei, mas foi um idiota... muito inteligente. Com este pedido bizarro (que depois foi moderado), os Arcade Fire mostram ao que vêm e a quem querem agradar - sim, falo dos hipsters. Colocam cá fora um disco (pun intended) para ser consumido pelo quasi-mainstream (não exageremos, também não são a Rihanna), mas querem seleccionar o público que aparece nos concertos e, mais importante que isso, querem perpetuar a imagem de banda alternativa. Querem vender tanto como os U2, mas manter a aura de reclusos da indústria.

"Reflektor" é reluzente (basta olhar para a capa) e pretensioso e ainda bem. Nada contra tenho contra o pretensiosismo na música, ou não fosse eu fã de Rock Progressivo, ou de Glam Rock.
Com este álbum, os Arcade Fire querem o bolo de noiva e querem os cupcakes; querem tudo. E têm todo o direito de o fazer; são precisas mais bandas que reclamem o ceptro da indústria musical.
Mas não me venham com balões e confettis de ironia, apoiados em loas da Pitchfork e da restante comunidade hipster.
"Reflektor" é uma declaração de take over dos Arcade Fire, uma OPA hostil do panorama musical.

Ironia, my ass. Irónico é o facto de eu estar a condenar a bajulação da crítica para com "Reflektor", quando todo este blog é um exercício de bajulação a música. Isso sim, é ironia.